domingo, 19 de maio de 2013

Cotidiano



Ele veio tão diferente...

Perdeu o modo engraçado de andar,
Deixou a gagueira na outra esquina.
Soprou seus defeitos no ar
E decidiu voltar à sua sina.

Já era hora!

Ele veio tão igual...

Cometendo os mesmos erros do passado.
Se sujeitando a sofrer as mesmas dores.
E como já fez em outro lado,
Transformou o chão em um tapete de flores

Ninguém vai notar a pequena obra do desconhecido autor.
Vão julgar que chegou o Outono.
Afinal, as flores têm de cair uma hora
E o rapaz, como poucas vezes faz, olha pros céus e ora.

Ele veio tão ele...

Com os atos de um menino
Que sabe medir as consequências,
Que sabe jogar com paciência
Um jogo contra o destino

E vaga pela madrugada
Despedaçando um ramal de flores
E vaga é a madrugada.
Que sempre vem sussurrar sobre antigos amores

Encara a velha conhecida esperança,
Deixa no ar pela última vez seus defeitos.
Entra de vez na mesma dança
E ignora um pouco os anos mal feitos

Ele foi tão outra pessoa...

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Com a palavra, o rei

"Cês sabem que as canções nascem pelos mais diversos motivos ou circunstânceas, mas existem músicas que fazemos para outros compositores. Eu tava diante de uma entrevista de Jorge Ben Jor na qual ele dizia, ou alguém dizia, ou alguém dizia sobre ele, não me lembro bem, que ele jamais fez uma música triste. Puta! Achei aquilo lindo, cara. O cara nunca fez uma música triste; não é lindo isso? E aquilo me deu um sentimento de inveja boa, eu falei "que danado, rapaz". Eu procurei a música na qual eu tivesse mais alegria, aquela música na qual não vazasse a mínima nostalgia, a mínima melancolia, e aí achei. [...]"


Sem mandamentos.


Hoje eu quero a rua cheia de sorrisos francos
De rostos serenos, de palavras soltas
Eu quero a rua toda parecendo louca
Com gente gritando e se abraçando ao sol
Hoje eu quero ver a bola da criança livre
Quero ver os sonhos todos nas janelas
Quero ver vocês andando por aí
Hoje eu vou pedir desculpas pelo que eu não disse
Eu até desculpo o que você falou
Eu quero ver meu coração no seu sorriso
E no olho da tarde a primeira luz
Hoje eu quero que os boêmios gritem bem mais alto
Eu quero um carnaval no engarrafamento
E que dez mil estrelas vão riscando o céu
Buscando a sua casa no amanhecer
Hoje eu vou fazer barulho pela madrugada
Rasgar a noite escura como um lampião
Eu vou fazer seresta na sua calçada
Eu vou fazer misérias no seu coração
Hoje eu quero que os poetas dancem pela rua
Pra escrever a música sem pretensão
Eu quero que as buzinas toquem flauta-doce
E que triunfe a força da imaginação


Oswaldo Montenegro

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Canto pirata


O rosto na varanda não apareceu
Janela por janela eu vi o prédio se apagar
Com a frieza de quem já morreu
Engoli as lágrimas salgadas do meu mar

Até nunca mais, terra prometida!
Eu sinto que não te verei mais
Até mais ver, vida mal vivida!
Afogo no seco dos meus sais

E tomo frente da minha frota de uma embarcação
Um navio onde o capitão é também o marujo
Um mar sombrio onde o sim sempre é não

Um céu amendrotador e sujo
Onde nasceu um poeta que esqueceu como amar
E fala muito da última sílaba do verbo que não sabe mais usar

_Rima pobre à vista!